Por Matheus Brandão
Dar tratamento diferenciado à micro empresa e à empresa de pequeno porte durante o processo licitatório é um dever que encontra fundamento na Constituição Federal de 1988, arts. 170, inc. IX, e 179. Para regulamentar esse direito, o legislador editou a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, que foi alterada posteriormente, no dia 7 de agosto de 2014, pela Lei Complementar nº 147, que ampliou os benefícios para as microempresas.
A Lei Complementar nº 123/2006 cuidou não somente de incentivar as micro e pequenas empresas, mas permitiu criar condições diferenciadas para que esses incentivos sejam revertidos na promoção do desenvolvimento econômico e social do País. Ao elaborar normas que privilegiem determinado setor da sociedade, o legislador busca reduzir uma desigualdade preexistente e, se agir com sabedoria e cautela, pode equacionar o princípio da isonomia, na medida da desigualdade indispensável à satisfação eficiente do interesse público.
Em outras palavras, o pregoeiro e a Comissão de licitação têm ao seu alcance a possibilidade de utilizar o procedimento licitatório também como fonte geradora de emprego e renda para a sociedade. Essa possibilidade é o que se chama tecnicamente de uso de poder das compras governamentais.
Há, portanto, fundamentos constitucionais e legais para o Estado brasileiro utilizar seu poder de compra para promover o desenvolvimento das MPE. Na verdade, além da sua função básica de suprir a administração pública com bens e serviços, o processo de contratação pelo poder público pode ser uma estratégia de políticas voltadas para o desenvolvimento econômico sustentável, para a geração de emprego e renda e para erradicação da pobreza e das desigualdades sociais.
Por meio de uma portaria recente, o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços estabeleceu diretrizes para o tratamento diferenciado e simplificado às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito da pasta. A norma detalha:
Art. 2º A possibilidade de tratamento diferenciado e simplificado às microempresas e empresas de pequeno porte deverá ser previamente verificada nas hipóteses de:
I – negociações internacionais de interesse do MDIC que afetem direitos ou interesses das empresas referidas no caput;
II – programas, projetos e editais de chamamento públicos celebrados pelo MDIC ou por suas entidades vinculadas;
III – licitações e contratos administrativos celebrados pelo MDIC ou por suas entidades vinculadas;
IV – formulação de políticas públicas de competência do MDIC ou de suas entidades vinculadas;
V – exercício do poder de polícia do MDIC ou suas entidades vinculadas.1
Além de trazer explícita a verificação no art. 2º, a norma reserva especial atenção às licitações e contratos administrativos. A norma prevê que a Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa (SEMPE) deverá se manifestar quando identificar a existência de interesse das microempresas e empresas de pequeno porte. A norma ainda dispõe:
Art. 3º Nas licitações e nos contratos administrativos celebrados pelo MDIC ou por suas entidades vinculadas será conferido, sempre que possível, tratamento diferenciado e simplificado às microempresas e empresas de pequeno porte.
A norma prevê que nas hipóteses acima destacadas, os editais e contratos deverão conter cláusulas estabelecendo prazos de pagamento inferiores ao previsto no art. 40, XIV, “a”, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.
———-
1 MINISTÉRIO DA INDÚSTRIA, COMÉRCIO EXTERIOR E SERVIÇOS. Portaria nº 1.946-SEI, de 26 de novembro de 2018. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 29 nov. 2018. Seção 1, p. 53.