Jacoby Fernandes & Reolon Advogados Associado

Jacoby Fernandes responde sobre a tomada de decisão em uma hora difícil para o portal Sollicita

Você sabe o que fazer quando encontra entendimentos diferentes?

Descubra o que fazer nessa situação

Por Aline de Oliveira

Você já se pegou diante de uma decisão a ser tomada, mas verificou que o TCU, a AGU, o Ministério da Fazenda, e o STJ, por exemplo, pensam de formas diferentes? Que eles têm entendimentos diversos sobre uma mesma doutrina? O que você faz?

Não dá uma vontade de ir e perguntar no Posto Ipiranga? Calma, agora você terá quinzenalmente no Sollicita a seção “O Divã”.

Então pergunte ao Sollicita!

Veja as respostas e opiniões dos especialistas sobre a tomada de decisão em uma hora difícil como essa:

Ronny Charles, Advogado da União – “Este é um problema até mesmo dentro da própria AGU. Às vezes um órgão da AGU tem um entendimento, e outro órgão tem uma opinião diferente. Não é algo fácil, pois há sempre divergências de entendimento, mesmo dentro do mesmo órgão, dentro do Tribunal, entre as câmaras há divergência. Da AGU para o TCU haverá divergência.

O que eu acredito é que o pregoeiro, ou o agente de licitação, muitas vezes dentro desse dilema deve adotar o bom senso e tomar à medida que busque o interesse público. Mas não tem uma resposta fácil, não me parece que é uma resposta objetiva.

Vejam um exemplo, a definição de suspensão é algo unânime, é restringir o direito de ser contratado ou de participar de licitação. Mas ainda hoje há uma divergência entre entendimentos do TCU e o STJ. Como a AGU, o TCU entende que restrição vale apenas para o órgão que aplica a sanção e o STJ tem um raciocínio de que a sanção valeria para toda a Administração Pública. Eu sempre digo aos meus alunos: Entre o TCU e o STJ eu sempre opto pelo TCU, porque o TCU pode aplicar multa”, resolve Charles.

Advogado da União. Palestrante. Professor. Mestre em Direito Econômico. Pós-graduado em Direito tributário. Pós-graduado em Ciências Jurídicas; Membro do Grupo de Editais de Licitações da AGU. Membro da Câmara Nacional de Uniformização da Consultoria Geral da União. Membro do corpo editorial da Revista da Doutrina e Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

 

Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, advogado, professor de direito administrativo, escritor, consultor, conferencista, palestrante – “Eu passei no Concurso de Procurador do Ministério Público do Tribunal de Contas do Distrito Federal. É um cargo maravilhoso, tem todas as regalias do mundo. Então eu, por uma questão pessoal, conversei com o Diretor Geral e disse que eu tenho por hábito conhecer onde estou trabalhando, que queria fazer uma visita em todo prédio de ponta a ponta. Ele achou aquilo inusitado, mas concordou e foi comigo.

Eu chegava ao local e o Diretor me apresentava – Esse é o novo procurador do Ministério Público. Até que cheguei a uma sala, uma inspetoria, e o cidadão falou assim: – O senhor dá licença? Eu disse: – Pois não! Ele – Eu posso tocar no senhor? E veio e pegou meu braço e disse: – Nossa parece que o senhor é de carne e osso. Eu entendi. Mas perguntei qual o motivo da brincadeira. Ele respondeu: – É porque vocês vivem encastelados naquele canto, não conversam com o servidor, nem dizem bom dia. Mas sabe o que é pior? É eu ter que instruir um processo dentro do Tribunal de Contas sem saber qual procurador vai opinar. Porque vocês não conversam nem entre vocês. E a gente fica aqui com três ou quatro teses diferentes do mesmo processo e eu não sei como instruir um processo.

Foi uma pancada para mim. Mas foi um ideia de caminho para eu trilhar. Então sugeri sumular as matérias que divergimos e melhorou muito.

Em um recurso uma vez um servidor me disse assim: – Professor, eu não vou recorrer disso, isso pode pegar mal, e podemos ficar marcados por estar recorrendo. E eu disse: – Então vamos começar juntos esta peça?  E comecei assim “Cumprindo com o dever de contribuir para o aperfeiçoamento das decisões venho apresentar recurso”. Porque o recurso é isso. E se há divergência, temos que levar as pessoas entenderem que elas estão divergindo.

Então é ideal recorrer ao Ministério da Fazenda se a decisão não foi boa, e recorrer ao TCU, pois são muitas as vezes que o TCU muda de ideia e de entendimento em um recurso. A AGU muda. Mas a gente acaba não compreendendo que eles são de carne e osso e adquirimos um temor que não é próprio ao regime democrático, ao serviço público. Então se é divergente eu vou recorrer.

Lembre-se, todos são de carne e osso e é dever de quem expede orientação tentar harmonizá-las com as de outras instituições. Eu sei de casos de decisões que o TCU harmonizou suas jurisprudências com do STJ. Então recorra, é seu dever”, aconselha Jacoby.

Advogado, mestre em direito público, professor de direito administrativo, escritor, consultor, conferencista e palestrante. Desenvolveu uma longa e sólida carreira no serviço público ocupando vários cargos, dos quais se destacam: Conselheiro do Tribunal de Contas do Distrito Federal, Membro do Conselho Interministerial de Desburocratização, Procurador e Procurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Distrito Federal, Juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, Advogado e Administrador Postal da ECT e, ainda, consultor cadastrado no Banco Mundial.

 

Ministro Benjamin Zymler, do Tribunal de Contas da União – “Eu me lembrei de um caso bem interessante, que mostra como estarmos sentados no nosso gabinete pode prejudicar muito a apreciação que a gente tem do mundo real nos processos.

Eu estava numa sessão de câmara e estava relatando um processo, nós estávamos criticando cláusulas colocadas num edital de licitação, eram cláusulas restritivas a competitividade, exigências de habilitação não previstas na Lei, e eu fui muito duro e comecei a dizer que aquilo era um absurdo, mandei anular a licitação e determinei que fosse aplicada multa ao gestor e todos os ministros me seguiram, usaram palavras candentes. Sai todo feliz, achando que estava agindo de acordo com a moralidade pública. Quando chego ao meu gabinete, vejo um monte de gente na porta, pessoas conhecidas e algumas chorando. Entrei no gabinete e duas servidoras do TCU as lágrimas me disseram: “Ministro o senhor acabou de multar uma gestora e nós fazemos exatamente isso há uns dez anos aqui no TCU. Nós vamos ser multados também”.

E ai eu fui compreender a razão pela qual aquela exigência era absolutamente razoável, ouvi de pessoas de que entendiam de serviço de terceirização, do mundo real, as razões, e o que antes era para mim absurdo, vi que era concreto, real, razoável e obviamente no recurso isso tudo foi afastado. Eu quase pedi desculpas aos gestores pela falta de prudência na decisão.

Esse encastelamento é péssimo, pois você não se oxigena com idéias novas. O TCU é autônomo, um órgão de estatura constitucional, quando faz seus julgamentos ele não se submete ao parecer na AGU ou do Ministério da Fazenda. Mas veja bem, o TCU atua sempre de duas maneiras: uma maneira objetiva e uma maneira subjetiva. No controle corretivo e objetivo, o TCU pode discordar da AGU e dizer “olha esses pareceres são maravilhosos, mas meu entendimento é este e, portanto quero que anule a licitação”. Agora quando o Tribunal exerce o controle punitivo e subjetivo, é claro que ele leva em consideração pareceres que orientaram a atenção do gestor, ou seja, ninguém vai punir um gestor que de uma forma razoável seguiu uma recomendação da AGU ou uma nota técnica do Ministério da Fazenda, mesmo eu discordando do parecer ou da nota técnica. Então quanto a isso podem ficar tranqüilos, o Tribunal não tem essa sanha persecutória, na verdade esse controle punitivo ganha cada vez menos importância diante do controle corretivo.

Agora, é obvio, que se você é submetido à jurisdição do TCU e resolve aderir a um parecer da AGU, é melhor deixar bem claro que você agiu de acordo com uma norma estabelecida com efeitos vinculantes pela AGU. Mas se a matéria já foi bem discutida é de bom tom que você siga as orientações do TCU que afinal tem força punitiva, e sancionatória.

Mas, diante de uma dúvida entre o poder judiciário e o TCU, eu ouso discordar do TCU, pois no Brasil prevalece o monopólio da jurisdição, então quem dita o direito em última instancia sem dúvida é o poder judiciário. Então ninguém será punido pelo TCU se adotar a posição do STJ, que tem o poder de última instancia no Brasil”, explica Zymler.

Ministro do Tribunal de Contas da União desde 2001, onde ingressou no cargo de Ministro-Substituto em 1998 por meio de concurso público de provas e títulos; Mestre em Direito e Estado pela Universidade de Brasília, com vasta experiência em Direito Administrativo e Direito Constitucional; Ministrou cursos na Escola da Magistratura do Distrito Federal e Territórios, Escola da Magistratura do Trabalho, Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, Instituto Superior de Brasília – IESB, Centro Universitário de Brasília – UniCeub, Instituto Serzedello Corrêa, entre outros.

 

Casos vivenciados pelos pregoeiros

Essa situação é muito comum, mas comum do que imaginamos.

Jamil Manasfi da Cruz é Pregoeiro, Leiloeiro e Presidente da Comissão Permanente de Licitação de Materiais e Obras e Leiloeiro da Companhia de Águas e Esgotos de Rondônia – CAERD, Coordenador de Licitações e Pregoeiro do Conselho Regional de Administração de Rondônia – CRA-RO, e contou que a situação constantemente acontece, ao realizar pesquisas para responder recursos administrativos e até para orientação na operacionalização dos Pregões.

“A divergência não é só entre a AGU e TCU, a divergência é entre os próprios técnicos dos órgãos fiscalizadores e pareceristas, o que dificulta bastante o processo de tomada de decisão do Pregoeiro, pois não sabemos qual linha de entendimento seguir. Para solucionar a situação, recorri a Doutrina e a consultas junto aos doutrinadores, só então, depois de esclarecer a matéria e que pude optar pelo Órgão que iria seguir em minha tese de defesa. Tenho observado que grande parte dos pregoeiros tem seguido cegamente o que disciplina o TCU em seus Acórdãos, o que não implica dizer que na prática e na operacionalização do Pregão seja a melhor forma de solucionar o problema”, conta.

Filipe Martins, Chefe do Setor de Administração e Compras (SEACO), do CEFET (RJ), relata que infelizmente o trabalho diário, tanto do pregoeiro, quanto da equipe de apoio encontra barreiras constantes no tocante à interpretação de legislação.

“Deparamos-nos com questões legais que precisam ser analisadas por nós, como se fossemos juristas. Sou formando em Engenharia de Controle e Automação e em Gestão Pública, mas nenhuma dessas me prepara para ler, interpretar ou dar parecer jurídico em documentos com excesso de formalidades legislativas.

Por mais de uma vez, encontrei situações que precisei me valer de dicionários, google ou de amigos formados em Direito para realizar uma interpretação razoável do assunto. Ainda preciso levar em conta as imprecisões dadas pelos muitos órgãos de controle, como TCU, AGU, MPOG, que têm entendimentos diferentes em assuntos que nós, pregoeiros, não temos alta capacitação.

Um exemplo se deu em um Pregão que operei ano passado, realizei tudo, conforme manda a legislação, mas na fase de aceitação, me deparei com impedimento de licitar da empresa.  O TCU (Acórdão 1539/2010-Plenário) diz que o impedimento é só com o órgão que aplicou a sanção, mas o STJ (REsp 151567 / RJ – SEGUNDA TURMA – STJ) diz que se um órgão está impedido de licitar é por não ter idoneidade e isso gera impedimento pra toda a Administração Pública.

Após longo estudo, pautado nos nos incisos III e IV do art. 87 da Lei 8.666/93, juntamente com a Equipe de Apoio, decidimos por acatar a fala do STJ, pois a falha da empresa era grave e repetitiva, já que além do impedimento de licitar, a mesma ainda tinha mais notações que demonstravam a possível falta de hombridade por parte da empresa.

Minha recomendação aos colegas, membros das CPLs (Comissão Permanente de Licitação) é:  Debata o assunto com a equipe de apoio e com os colegas pregoeiros com mais experiência e não se atente só à legislação, mas também ao histórico da licitante. Diz muito mais sobre ela do que os documentos habilitatórios encaminhados por ela”, assegura Martins.

O Agente Administrativo, pregoeiro, gestor de viagens e coordenador de capacitação da Polícia Federal em Sergipe, Ronaldo Corrêa, contou dois casos interessantes vivenciados em sua instituição.

“A partir de 2008, a equipe técnica da Polícia Federal decidiu licitar o objeto “sistema de manutenção de frota por cartão magnético”, devido a nossa necessidade de atuar em todas as localidades do país. Como para isso dependemos totalmente de veículos em bom estado de funcionamento, a contratação de uma ou mais oficinas não nos atende plenamente. Ocorre que a AGU local sempre foi contra tal metodologia de contratação, e o TCU passou a analisar tal modelo, após representação de uma empresa (que inclusive contratou o professor Jacoby como advogado para esse caso). Outras CJUs locais, esporadicamente expediram parecer favorável à contratação dessa solução. E em sede de análise preliminar, o TCU apontou a suposta validade jurídica e provável economicidade do referido modelo de contratação. Assim, com base na prerrogativa de discrepar de pareceres não vinculantes, optamos por manter a metodologia de contratação”, relata Corrêa.

O outro caso “É que recebemos da CGU local uma solicitação de auditoria questionando o porquê de não reenviarmos o processo de contratação para análise jurídica, quando discreparmos do parecer da Consultoria Jurídica da União (CJU). Mesmo diante de tal questionamento, mantemos nossa decisão de não reenviar o processo para análise jurídica, já que o parecer não é vinculante e o primeiro envio à CJU já cumpre plenamente a obrigação legal. Entendemos que o reenvio seria um excesso de formalismo, já que, mesmo a lei de licitações exigindo a análise e “APROVAÇÃO” das minutas pela consultoria jurídica, de toda sorte o parecer nunca será totalmente vinculante. O ato de gestão é de competência privativa do gestor, e a responsabilidade é totalmente dele, não do advogado consultor”, afirma Corrêa.

André Bezerra da Silva, pregoeiro da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), contou que a UFRPE utiliza, por recomendação da Douta Procuradoria Jurídica, os modelos de Minutas de Editais da Advocacia Geral da União – AGU.

“Recentemente promovemos uma licitação na Modalidade Concorrência e o nosso Edital sofreu uma Impugnação referente ao Item CAPACITAÇÃO TÉCNICO-OPERACIONAL, quanto ao Registro no CREA dos Atestados. O TCU já havia dito (em 2016) à Universidade de Brasília – UnB, que “a exigência de registro no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA) dos atestados de qualificação técnico-operacional não tem amparo legal e está em desacordo com os Acórdãos de nºs 128/2012-2ªC, 1.452/2015-P e 655/2016-P e com a Resolução/CONFEA nº 1.025/2009.  (item 9.2.1, TC-012.348/2016-3, Acórdão nº 7.260/2016-2ª Câmara)”

Mesmo após várias decisões ANTERIORES, as Minutas da AGU continuam com a referida exigência, qual seja:

“Quanto à capacitação técnico-operacional: apresentação de um ou mais atestados de capacidade técnica, REGISTRADOS NO CREA/CAU, fornecido por pessoa jurídica de direito público ou privado devidamente identificada, em nome do licitante, relativo à execução de obra de engenharia, compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da presente licitação…”

Entendo que não cabe ao Pregoeiro ou a CPL a análise jurídica dos Editais de licitação e que, diferentemente do CREA, a empresa não teria a capacidade técnica simplesmente porque o seu Engenheiro a detém, logo, após consulta à Procuradoria Jurídica, mantivemos o texto original da Minuta da AGU. Enfim, após a explanação dos fatos o depoimento que deixaria é o seguinte: A não uniformização do entendimento pelos Órgãos de Controle (CGU, AGU, TCU…), causa prejuízos incalculáveis, não apenas para os Licitantes, mas principalmente para a Administração Pública, pois cria insegurança nas tomadas de decisões pelos gestores, retardamento e até mesmo a inviabilização do processo de contratação pública, entre outros”, afirma Silva.

Fernando Timbó, servidor da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, contou também que já se pegou diante de uma decisão a ser tomada, mas verificou que o TCU e o STJ pensavam de formas diferentes. “Já me encontrei nessa situação sim, um exemplo disso é aquela questão dos efeitos da penalidade de suspensão temporária de licitar e contratar com a Administração Pública. O STJ entende de uma forma e o TCU de outra completamente diferente”, afirma Timbó.

Everton Rogério Alves Cavalheiro, Chefe do Departamento de Licitações da Universidade Federal da Fronteira Sul, concorda que a situação é muito comum.

“Amigos, essa situação não é rara na nossa atividade, em caso de discrepância entre órgão (TCU, CGU, AGU,…) creio que o mais salutar seja seguir o entendimento do TCU. Caso a discrepância esteja no julgado do TCU, entendo que seja mais salutar assimilar a decisão mais recente, e principalmente, entender que todo e qualquer julgado trata de situação específica. Assim, em alguns momentos, por mais que o caso seja semelhante ao nosso, não é apropriado que sigamos ao pé da letra o disposto no acórdão, é mais razoável que façamos uma interpretação do contexto em que foi julgado o fato e nos posicionemos analisando o nosso contexto”, conclui Cavalheiro.

Fonte: portal Sollicita.

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